sexta-feira, 25 de maio de 2012

Como foi o acompanhamento do dia de trabalho de um fotojornalista


Foto:Leandro Cunha

Em um trabalho de campo realizado na disciplina de Fotojornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), nós alunos fomos incumbidos de escolher um período de um dia na semana para realizar uma vistita a um dos jornais da cidade do Natal com o subsequente acompanhamento de um Repórter Fotográfico em sua rotina de trabalho. 

Acompanhei o Repórter Fotográfico do O Jornal de Hoje, Wellington Rocha, que trabalha com o equipamento Nikon D90, de objetiva 18-105 mm, esta que já vem na máquina. O fotojornalista usa somente a objetiva em questão. Segundo ele, o instrumento de trabalho não é fornecido, portanto, é pessoal, e o jornal não paga o aluguel por isso.

Fomos para duas pautas, ambas com a mesma repórter de texto da editoria de Cidades do jornal, Fernanda Souza, na segunda-feira pela manhã, dia 7 de maio de 2012. A primeira foi sobre o caos da saúde pública no estado do Rio Grande do Norte, mais precisamente no hospital regional Deoclécio Marques de Lucena, no município de Parnamirim. Dando prosseguimento a temática de greves no estado, depois fomos para a segunda pauta, no Campus Central da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), localizado na Avenida Ayrton Senna, em Natal, sem aulas na ocasião.

Primeira Pauta

Chegando ao hospital, Wellington Rocha foi logo entrando nas dependências do mesmo sem fazer muito alarde. Enquanto a repórter conversava com uma fonte, o fotógrafo começou a buscar personagens para compor as imagens. Encontrou uma senhora com uma criança, ambas sentadas numa cadeira, ele se abaixou e fez a foto delas numa posição em que elas estavam de costas.

Indagando sobre a falta de uso do flash num ambiente não tão claro, perguntei o porque daquilo ao fotógrafo. Ele respondeu justificando com o resultado do processo de feitura da primeira fotografia. “Não uso flash para não despertar as pessoas. Se eu tivesse usado a mulher ia perceber”, disse. 

Na fachada do hospital, Wellington Rocha teve a paciência de esperar o momento certo da passagem de um paciente na entrada para compor a foto juntamente com o faixa “Estamos em Greve”. 

Foto:Leandro Cunha

Indo até a parte de pediatria, o fotógrafo evitava o tempo inteiro os rostos das crianças, apesar de não deixar de fazer as imagens. Pegou muitas vezes o corpo de algumas delas tomando soro e complementava a foto com o corpo de algum responsável que estava respondendo pela situação do hospital. Em momentos em que adultos apareciam no local da especialidade para serem medicados, o fotógrafo também evitava os rostos deles. Numa ocasião em que um paciente estava olhando para a lente do fotógrafo, este pediu àquele virar o rosto para o outro lado.

Wellington Rocha aparentava ser bastante íntimo de algumas pessoas de dentro do hospital, pois ficou conversando várias vezes com algumas delas. Falou de futebol e de que havia trazido uma pessoa na semana anterior para tomar soro, mas que o líquido transparente estava faltando. Isso fez com que muitas vezes a dispersão o fizesse se perder da repórter, ao não saber onde ela estava em vários momentos.

Porém, a amizade do fotógrafo com algumas pessoas rendeu frutos para o incremento de imagens em locais que a administração dizia não poder entrar. Valendo-se da máxima jornalística de que “em lugar que não pode ser mostrado, há coisas erradas”, Wellington Rocha teve a curiosidade de ir atrás. Uma das enfermeiras disse que o levaria ao local, o que rendeu fotografias de pessoas jogadas nos corredores do hospital.

Ao final da primeira pauta, Wellington Rocha revelou que não gosta de fazer muitas fotos de uma situação e explicou porque disso ao sair para rua. “Nosso trabalho não é valorizado, já que uma ou no máximo duas fotos é que vão para o jornal”. Então ele diz fazer apenas o suficiente. O fotógrafo disse ainda, sem citar nomes, que uma vez suas fotos foram para votação para saber qual ia para o jornal, passou por todo mundo que faz a redação, incluindo pessoas que não são envolvidas diretamente com o jornalismo e até foi votada por um menino que cuidava de carros no estacionamento. 

Sem a presença do editor de fotografia no jornal, Wellington Rocha não faz cerimônia para dizer quem escolhe a foto que vai estampada no jornal: “É o diagramador!”, falou em voz alta.
Foto:Leandro Cunha


No final da primeira pauta, ainda fez fotos da diretora do hospital. Para isso se aproximou ao máximo dela para fazer o boneco. 
Foto:Leandro Cunha


É bom lembrar que Wellington Rocha ainda perguntou o tempo todo o nome dos entrevistados à repórter para fazer as anotações. Apesar de não escolher as fotos que vão para o jornal, é ele que as legenda.

Segunda Pauta

A ida à UERN foi mais tranquila. Como a universidade estava em greve, o lugar estava bem vazio com poucos alunos, que estavam fazendo monografia e artigos científicos, e apenas alguns seguranças, além de outras pessoas da secretaria.

Assim sendo, Wellington Rocha fez apenas fotos da fachada da universidade, a entrada vazia e os bonecos de alunos bolsistas em pesquisa de iniciação científica e de um responsável que estava respondendo sobre a situação no local.

Indagado pela repórter sobre sugestões para lugares a serem feitas as fotografias, Wellington Rocha adotou o seguinte posicionamento: “Eu não gosto que repórter nenhum se meta no meu trabalho, que está fazendo a fotografia sou eu”. A distância entre os dois profissionais fica esclarecida ao saber que o repórter fotográfico não recebe a pauta.

Durante a execução do ato fotográfico, Wellington Rocha tem uma mania. Ele usa boné, e toda vez que vai fotografar vira-o para trás, colocando de volta a maneira usual após o clique. 

Antes de irmos embora, Wellington Rocha se mostrou ativo na questão de resolver o problema do transporte que havia designado para a nossas pautas e a de um outro repórter que estava em outro lugar. O fotógrafo pareceu bastante irritado com o fato de apenas um carro ter que fazer tudo isso e telefonou para a redação dizendo que tinha terminado o serviço e que estávamos em determinado local esperando. Além disso, ao telefone, o fotógrafo relatou ao editor que o motorista estava de mau-humor por ter que ir, deixar o outro repórter e depois ter que ir nos buscar.

Durante a espera, um momento para conversar sobre sua trajetória na profissão. Wellington Rocha falou de seus trabalhos anteriores, mercado local (para ele, quem paga melhor também explora mais trabalhando em datas comemorativas), desvalorização do profissional e até de sua vida pessoal.

Por fim, voltamos à redação, Wellington Rocha baixou as fotos no computador pelo cartão de memória e sem o tratamento do Photoshop recebeu a voz da diagramadora comprovando o que havia dito. “Deixa eu ver as fotos para ver o que cabe sem atrapalhar o anúncio”.

Resultado do trabalho

As matérias foram publicadas em dias diferentes e também em meios diferentes.


Valendo-se da máxima “Notícias que outros publicarão amanhã”, o O Jornal de Hoje colocou a matéria da saúde no mesmo dia em que foi feita, tanto no jornal impresso que vai para as bancas a partir das 16h, quanto no recém-inaugurado portal o mesmo texto. A matéria impressa que não veio assinada ganhou a metade da parte de baixo da página 6 da editoria de Cidades e foram colocadas 2 fotos em preto e branco creditadas. Na matéria online não foi colocada foto alguma e também não foi assinada.


O slogan que o jornal sustenta foi quebrado com a matéria da UERN. O referido trabalho foi para o jornal impresso no dia seguinte a feitura, mais precisamente na página 19 da editoria de Cidades em duas colunas no canto superior direito da página. A matéria foi para o portal também no dia seguinte com o mesmo texto. As matérias iguais colocadas nos diferentes meios estavam sem fotografia alguma e também não estavam assinadas.

Conclusão

De valiosa contribuição para o aprendizado sobre o estudo de como funciona o trabalho de um Repórter Fotográfico em um determinado jornal na prática, a avaliação proposta pela disciplina de Fotojornalismo serviu para pensar sobre o envolvimento do fotojornalista com a pauta, as iniciativas do mesmo perante as temáticas, o posicionamento diante de uma fonte, o uso da técnica com o equipamento servindo de auxílio e o mercado local.

Com a ida ao O Jornal de Hoje e ter acompanhado o Repórter Fotográfico Wellington Rocha, conclui-se que:

- É sempre bom o fotojornalista ter contato com a pauta para planejar a imagem que pode ser feita e evitar a fuga do direcionamento da mesma, evidenciado com o distanciamento que teve da repórter.
- O envolvimento com o tema pode fazer com que o fotojornalista tome iniciativas que revelem o diferente ou evidencie ainda mais uma denúncia. Uma prova disso foi a entrada em setores do hospital antes não permitido.
- O posicionamento diante de uma fonte varia de cada fotojornalista. No caso de Wellington Rocha, ele evitou o rosto de crianças e até de adultos em estado ruim de saúde para preservar a identidade dos mesmos. Evitou também as exposições de cenas grotescas de pessoas doentes, apesar de estar em um hospital público na ocasião.
- O mercado local é complicado para o Repórter Fotográfico de Redação. Exige muito e não recompensa em reconhecimento do trabalho do fotojornalista. A desvalorização fica evidente no estudo de caso na escolha da foto que vai para o jornal ser definida pelo diagramador.

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