Foto:Huynh Cong 'Nick' Ut |
Nenhuma guerra produziu tantas imagens e mexeu com os
sentimentos e a opinião pública mundial quanto a Guerra do Vietnã (1959-1975).
E nenhuma foto, entre os milhares de registros dos campos de batalha, ficou tão
profundamente gravada na memória das gerações que vivenciaram o horror daquele
conflito quanto a das crianças correndo por uma estrada, tentando escapar de um
bombardeio. No centro da cena, uma menina magra, nua, desesperada, ferida. Esta semana, aquela foto estará completando
40 anos.
Era 8 de junho de 1972, no Vietnã, e o fotógrafo Huynh Cong
'Nick' Ut viu algumas crianças correndo, tentando escapar de seguidas explosões
na vila de Trang Bang, na província de Tay Ninh. Ele não pensou duas vezes
antes de fotografar a cena.
A garotinha de 9 anos, nua, gritando "muito quente,
muito quente", enquanto tentava escapar das bombas, era Kim Phuc entre o
irmão mais novo, Phan Thanh Phouc, que perdeu um olho, e dois primos, que
aparecem de mãos dadas, Ho Van Bon e Ho Thi Ting.
A imagem tornou-se um dos símbolos da Guerra do Vietnã. Kim
Phuc está com 49 anos e diz que a foto a perseguiu a vida inteira. "Eu
realmente quis escapar daquela menina", diz Phan Thi Kim Phuc. "Eu
queria escapar dessa imagem, mas parece que a foto não me deixou escapar",
disse ela, que hoje comanda uma fundação para ajudar crianças vítimas da
guerra. "Eu fui queimada e me tornei uma vítima da guerra, mas crescendo,
tornei-me outro tipo de vítima", completa ela.
Ao relembrar o momento em que a foto foi tirada, ela diz ter
ouvido fortes explosões e que o chão "tremeu". "Eu vou ficar
feia, não serei mais normal. As pessoas vão me ver de um jeito diferente",
ela diz ter pensado na hora, ao perceber que sua mão e braço esquerdos estavam
queimados.
Em choque, ela correu atrás seu irmão mais velho e não se
lembra de reparar nos jornalistas estrangeiros reunidos enquanto corria na
direção deles, gritando. Depois disso, ela perdeu a consciência.
Foto do grupo de criança tentando escapar de um bombardeio
de uma aldeia vietnamita, em 1972, foi uma das imagens mais chocantes do
conflito nosudoeste asiático.
"Eu chorei quando a vi correndo", diz Ut, que
cobria a guerra pela Associated Press. "Se eu não a ajudasse e alguma
coisa acontecesse que a levasse a morte, acho que eu me mataria depois",
comenta o fotógrafo, que nunca mais deixou de falar com Phuc. Ele a deixou em
um pequeno hospital e fez os médicos garantirem que tomariam conta da garota.
A foto foi publicada e, alguns dias depois, outro
jornalista, Christopher Wain, um correspondente britânico que tinha dado água
de seu cantil a Phuc, descobriu que ela tinha sobrevivido. A garota tinha sido
transferida para uma unidade americana em Barsky, única instalação em Saigon
equipada para lidar com ferimentos graves.
"Eu não tinha ideia do que tinha acontecido
comigo", diz Phuc. "Acordei no hospital com muita dor e com
enfermeiras ao meu redor. Acordei com um medo terrível". "Toda manhã,
às 8 horas, as enfermeiras me colocavam em uma banheira com água quente para cortar
toda a minha pele morta. Eu só chorava e quando eu não aguentava mais,
desmaiava", relembra ela que hoje vive com o filho e o marido, Bui Huy
Toan, no Canadá.
Depois de vários enxertos de pele e cirurgias, Phuc foi
finalmente autorizada a deixar o hospital, 13 meses após o bombardeio. Ela
tinha visto foto de Ut, que até então tinha ganhado o Prêmio Pulitzer, mas
ainda não sabia do alcance e poder da imagem.
"Fico muito feliz em saber que ajudei Kim", disse
Ut, que ainda é fotógrafo da Associated Press. "Eu a chamo de minha
filha", brinca. "A maioria das pessoas conhece minha foto, mas sabe
pouco sobre minha história", diz Phuc. "Fico agradecida por poder
aceitar essa foto como um presente. Com ela, eu posso usá-la para a paz."
O que foi
A Guerra do Vietnã foi um conflito armado ocorrido no
Sudeste Asiático entre 1959 e 30 de abril de 1975. A guerra colocou em
confronto, de um lado, a República do Vietnã (Vietnã do Sul) e os Estados
Unidos, com participação efetiva, porém secundária, da Coreia do Sul, da
Austrália e da Nova Zelândia; e, de outro, a República Democrática do Vietnã
(Vietnã do Norte) e a Frente Nacional para a Libertação do Vietname (FNL). A
China, a Coreia do Norte e, principalmente, a União Soviética prestaram apoio
logístico ao Vietnã do Norte, mas não se envolveram efetivamente no conflito.
Em 1965, os Estados Unidos enviaram tropas para sustentar o
governo do Vietnã do Sul, que se mostrava incapaz de debelar o movimento
insurgente de nacionalistas e comunistas, que se haviam juntado na Frente
Nacional para a Libertação do Vietname (FNL). Entretanto, apesar de seu imenso
poder militar e econômico, os norte-americanos falharam em seus objetivos,
sendo obrigados a se retirarem do país em 1973 e dois anos depois o Vietnã foi
reunificado sob governo socialista, tornando-se oficialmente, em 1976, a
República Socialista do Vietnã.
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